
Bastou um ano. Tempo suficiente para a Rua São José, no Centro do Rio, apresentar um balanço que inverte a curva histórica de vacância e degradação tão associada à região. O pequeno trecho de 180 metros foi o primeiro da América Latina a receber uma ARE (Área de Revitalização Econômica), projeto capitaneado pela Aliança Centro — grupo formado por mais de 300 prédios e empresas com histórico no Centro do Rio. E os números confirmam: a iniciativa virou vitrine.
Desde o início da ARE, a taxa de ocupação aumentou 31%. As câmeras de contagem instaladas pela associação registram hoje média de 12 mil pessoas circulando diariamente, totalizando 320 mil ao mês. No mesmo período, o número de ocorrências de segurança e zeladoria caiu de mais de 200 para apenas 19 em abril.
“Essa região, com segurança, com limpeza, com lavagem semanal das ruas, com uma sensação de ambiência melhor, significou, junto com a melhora econômica da cidade, um aumento no fluxo. E isso sem contar o decréscimo das ocorrências”, explica Marcelo Haddad, líder da Aliança Centro. Segundo ele, a rua virou exemplo de que a reocupação urbana não depende apenas de grandes obras, mas de gestão coordenada e presença constante.

O que é a ARE?
Inspirada em modelos consagrados como o da Times Square, em Nova York, e os distritos de Londres e da Cidade do Cabo, a ARE é uma parceria público-privada voltada à requalificação urbana. O projeto da Rua São José é o primeiro do tipo no Brasil e foi estruturado pela Aliança Centro, que inclui nomes como Sergio Castro Imóveis, Opportunity, Multicentros, Construtora Internacional e outros. A iniciativa é respaldada por decreto municipal e opera com base em estatuto próprio.
Na prática, a ARE permite que prédios comerciais e empresariais formem consórcios de autogestão para custear serviços complementares aos da Prefeitura. Entre eles: limpeza urbana especializada, instalação de câmeras, contagem de fluxo, iluminação reforçada, mobiliário urbano, segurança com vigilantes, paisagismo e manutenção constante. A iniciativa já gerou aumento de 20% para 61% na taxa de resolução de demandas urbanas reportadas semanalmente aos órgãos da Prefeitura via sistema integrado de georreferenciamento.

A ideia segue o conceito dos BIDs (Business Improvement Districts), modelos de governança urbana adotados com sucesso em Manhattan, Londres e Toronto, onde distritos comerciais aram a ser mantidos com recursos diretos dos seus usuários, em troca de maior eficiência na prestação de serviços.
A ARE da Rua São José está na fase final de implementação. Agora, a associação aguarda autorização da Prefeitura do Rio para a instalação de novo mobiliário urbano na área — a última etapa da revitalização. A primeira fase do projeto incluiu a instalação de câmeras de monitoramento na via. As etapas seguintes envolveram limpeza e remoção de pichações nos prédios ao redor.
Coworking lotado, cadeiras novas
Empresária e associada à Aliança, Kiki Lessa é dona de um espaço de coworking na Rua São José há quase três décadas. Ela viu o mercado minguar após a pandemia e quase fechou as portas. Hoje, vive outro momento. “amos por várias crises. A pandemia foi a pior. Mas a ARE melhorou muito essa região. Hoje tenho segurança, não escuto mais os gritos de furto na porta. Ocupamos mais um andar, compramos 50 cadeiras essa semana e estamos com 90% de ocupação”, conta.
O espaço abriga hoje 35 empresas, 90% do volume pré-pandemia. E a busca por salas cresceu 30% nos últimos meses. “Só não quebramos porque o imóvel é nosso. Hoje vejo o movimento voltar, principalmente às quintas-feiras, quando até a Casa Urich ocupa o outro lado da rua de tanto cliente.”
Segundo a Aliança Centro, a recuperação do comércio de rua e de serviços no entorno da ARE impulsionou também o faturamento de pequenas cafeterias, lojas e bancas, algumas das quais haviam encerrado as atividades nos últimos anos. O retorno da ambiência urbana atraiu inclusive investidores de fora da cidade, que aram a visitar imóveis disponíveis na região.
Da São José rumo à Candelária e Presidente Vargas

O sucesso do piloto fez com que outras regiões do Centro entrassem no radar da Aliança. O projeto já se expande para a região da Candelária, onde 11 dos 35 condomínios da área são associados à iniciativa. Foram instaladas 32 câmeras de segurança, já custeadas por esses associados. A meta é arrecadar R$ 1,3 milhão anuais para bancar a estrutura de vigilância, limpeza e mobiliário urbano.
“Como é inviável fazer isso com apenas 11 contribuintes, mapeamos 135 CNPJs com faturamento acima de R$ 10 milhões que ocupam os 35 prédios. Estamos vendendo a vantagem do modelo, como em outros lugares do mundo”, explica Haddad. A vigilância na região será feita por bicicletas. Os guardas atuarão com integração total com o 5º BPM.

A ideia é que o modelo avance também para a Avenida Presidente Vargas, com foco no trecho entre a Biblioteca Parque e a Avenida os, onde estão três das torres empresariais mais modernas da região. A área é vista como estratégica por ter concentração de escritórios em edifícios de alto padrão, que, até hoje, convivem com a má gestão municipal na via, que completou 80 anos de abertura recentemente.
“As Áreas de Revitalização Econômica são, hoje, praticamente a única forma encontrada para que uma rua pública conte com serviços e padrões semelhantes aos de um shopping center. Isso porque os vizinhos colaboram diretamente, via IPTU, para transformar o entorno em uma área de excelência na cidade. Por essa razão, é fundamental estimular a criação de novos BIDs no Centro do Rio”, afirma Cláudio André de Castro, membro fundador da Aliança Centro Rio.