Jorge Jaber – Álcool, drogas e direção: uma tragédia evitável nas estradas brasileiras

As estatísticas assombram. Em 2021, segundo pesquisa baseada em dados do Ministério da Saúde, motoristas alcoolizados provocaram a perda de 10.887 vidas – em média, 1,2 por hora – no verdadeiro campo de batalha em que se transformou nosso trânsito

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A cada feriado, as imagens se repetem pelas estradas de cada canto do país: veículos retorcidos, pessoas feridas ou em choque pela perda de parentes, cargas espalhadas pelo chão, engarrafamentos a perder de vista. Cenas que, de tão recorrentes, am quase despercebidas, sem provocar a revolta que as mortes, lesões físicas e mentais – algumas incapacitantes – e prejuízos financeiros provocados pelo número inaceitável de acidentes em nossas rodovias e vias urbanas deveriam despertar, principalmente diante da causa de boa parte deles: o consumo de álcool e outras drogas.

As estatísticas assombram. Em 2021, segundo pesquisa baseada em dados do Ministério da Saúde, motoristas alcoolizados provocaram a perda de 10.887 vidas – em média, 1,2 por hora – no verdadeiro campo de batalha em que se transformou nosso trânsito. O perfil preponderante das vítimas dá o que pensar: os homens respondem por quase 90% dos óbitos e 85% das hospitalizações por acidentes automobilísticos relacionados ao álcool, e a faixa etária mais afetada varia entre os 18 e 34 anos. Jovens, portanto, com histórias interrompidas ou abaladas por pura imprudência.

A barbárie ignora solenemente o bom senso e o respeito ao próximo e à própria legislação: somos um dos poucos países do mundo a estabelecer tolerância zero para a perigosa mistura entre álcool e direção, mas isso não impede que mais de 5% dos brasileiros assumam o volante depois de beber. Um dado vergonhoso, e provavelmente subdimensionado, diante do natural constrangimento em itir um comportamento, além de ilegal e sujeito a penas pesadas, perigoso, inclusive para terceiros. Uma teimosa insistência no erro que uma fiscalização mais rigorosa e capilarizada desestimularia.

A Lei Seca mostra que vigiar e punir é uma boa proposta, ainda que não a única. Desde sua instituição, temos verificado uma redução gradual nos índices dessa tragédia no asfalto: entre 2010 e 2021, a taxa de mortalidade por 100 mil habitantes caiu de sete para cinco, o que representa uma queda de 32%. O registro desses acidentes segue a tendência, diminuindo quase 34% entre 2019 e 2023, de acordo com a Polícia Rodoviária Federal. Em 2024, porém, a curva se inverteu, com aumento de 22% nas mortes e 7% nos acidentes, o que indica a necessidade de alguns ajustes nesse campo.

É possível, por exemplo, coibir o consumo de drogas ilícitas ao volante, principalmente maconha e cocaína, que reduzem a atenção e a coordenação motora e respondem por fatia considerável desses acidentes. Esta medida já foi implementada em países como Canadá, Estados Unidos e Alemanha, com testes de saliva ou de sangue para detectar a presença dessas substâncias no organismo do condutor. Na Itália, com um detalhe curioso: até os ciclistas estão sujeitos à fiscalização, com punições semelhantes às aplicadas aos motoristas, inclusive a perda temporária da habilitação.

Pode-se argumentar que a ideia representaria mais um baque aos nossos já exauridos cofres públicos, mas o impacto do problema sobre a economia brasileira – estimado em R$ 80 bilhões anuais, se considerarmos despesas médicas, prejuízos materiais, indenizações, licenças e aposentadorias, entre outras – justifica o investimento. Que poderia, além disso, impedir a dor pela perda precoce e evitável de vidas, a maioria de pessoas no auge da capacidade física e intelectual, com muito a oferecer a suas famílias e ao próprio país.

A humanização do trânsito, tema da campanha Maio Amarelo, a por diversos pontos – entre eles, a prevenção –, mas o combate mais efetivo à absurda mistura entre álcool, drogas e direção não pode ser descartado. Precisamos proteger a sociedade como um todo do comportamento egoísta e criminoso de alguns irresponsáveis, e a aplicação rigorosa das leis já existentes parece ser uma boa estratégia.

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