Celebrado no dia 19 de maio, o Dia Nacional da Defensoria Pública é muito mais do que uma efeméride: é um chamado à consciência cívica. Nesse dia, celebramos não apenas uma instituição, mas também a coragem de cada defensor ou defensora pública, que carrega a missão de garantir justiça a quem não tem voz, a quem foi deixado para trás, a quem, sem ajuda, não alcança nem a porta do fórum. Este artigo é um tributo e, ao mesmo tempo, um alerta: a democracia brasileira só será plena quando todos tiverem o real e efetivo à Justiça.
A Defensoria Pública: a Constituição em ação na vida do povo
A Constituição Federal de 1988 elevou a Defensoria Pública à condição de instituição essencial à Justiça. Isso não foi por acaso. Com raízes no compromisso social da Carta Magna, a Defensoria nasceu como ponte entre o povo excluído e o sistema judiciário, transformando direitos em realidade.
Não se trata apenas de representação em processos judiciais. A Defensoria orienta juridicamente, atua extrajudicialmente, realiza conciliações, propõe ações coletivas, educa em direitos, cobra políticas públicas. E faz tudo isso com orçamento limitado, número insuficiente de profissionais e presença parcial nas comarcas do país. Ainda assim, segue como um dos rostos mais humanos do Estado.
A missão de enxergar os invisíveis
Pessoas em situação de rua, mulheres vítimas de violência, populações ribeirinhas, indígenas, quilombolas, migrantes, encarcerados, idosos sem amparo, crianças negligenciadas – todos esses brasileiros e brasileiras que raramente ocupam os espaços de poder encontram na Defensoria Pública a possibilidade de serem ouvidos e reconhecidos.
É por isso que se afirma que a Defensoria não é apenas um órgão jurídico, mas também um instrumento de promoção dos direitos humanos. Sua atuação não depende da popularidade da causa, mas da necessidade do assistido. É nesses cantos esquecidos da pátria que o defensor e a defensora atuam como sentinelas da cidadania.
A Defensoria e o dever do Estado Democrático de Direito
Ao garantir o à Justiça, a Defensoria torna concreta a promessa constitucional de igualdade. Não há democracia sem mecanismos de defesa efetivos e gratuitos para quem mais precisa. E não se trata de caridade, mas de obrigação estatal.
O o à justiça é um direito civil fundamental, sem o qual os demais direitos constitucionais tornam-se meras declarações. Se o Estado não garante condições materiais para que o povo mais pobre acione a Justiça, então a democracia se rompe silenciosamente. A Defensoria é, nesse cenário, um reparo contínuo na rachadura da República.
A desigualdade orçamentária entre os que acusam, julgam e defendem
Não parece justo que quem acusa tenha estrutura e orçamento, quem julga tenha estrutura e orçamento, e quem defende os mais pobres tenha uma estrutura tão inferior.
Metade das comarcas ainda não possui sequer uma Defensoria Pública Estadual instalada. Em vez de exceção, isso deveria ser tratado como crise institucional. Afinal, não se sustenta um Estado Democrático de Direito com muletas orçamentárias.
Quando a tragédia escancara a desigualdade
As tragédias naturais não atingem a todos com o mesmo peso. As enchentes no Rio Grande do Sul revelaram isso de forma cruel. Em meio à lama, às casas destruídas e às unidades da Defensoria literalmente submersas, o que se viu foi a urgência de garantir direitos em meio ao caos.
E mesmo com tudo contra, defensores de vários estados se reuniram em força-tarefa para garantir atendimento à população desalojada, emissão de documentos, o a benefícios, recomposição de vínculos familiares e segurança jurídica mínima. Porque o direito não pode esperar a água baixar.
A educação em direitos: cidadania como prevenção
Promover a cidadania é também missão da Defensoria Pública. Oficinas jurídicas, ações de conscientização, atendimento itinerante em comunidades, visitas a presídios, aldeias e zonas rurais. A educação em direitos é uma das formas mais eficazes de prevenir conflitos, de fortalecer a democracia e de criar um povo que conhece e exige seus direitos.
Nas palavras de quem vive essa realidade, é preciso entender que hipossuficiência vai além da pobreza material. Idosos, crianças, mulheres em situação de violência, vítimas de racismo, LGBTQIA+, todos esses grupos enfrentam obstáculos que os afastam da Justiça. Por isso, a atuação da Defensoria deve ser sensível às diversas formas de desigualdade, sem se limitar à renda.
O papel da Defensoria na arquitetura constitucional da Justiça
A Defensoria Pública integra o capítulo das funções essenciais à Justiça, ao lado do Ministério Público e da Advocacia Pública. Isso significa que sua função não é menor ou ória – é central.
A assistência jurídica gratuita é direito previsto desde 1934, mas só em 1988 foi criada uma instituição específica com essa missão. E a ela se aplica o mesmo princípio da independência e da autonomia funcional, hoje assegurada pela Constituição.
Uma democracia que se constrói com justiça social
A Defensoria Pública é muito mais do que um órgão jurídico. É uma ferramenta de justiça social. É um farol para os que caminham nas margens. É a chance que a República oferece a quem, de outra forma, nunca pisaria no tapete de um tribunal.
Neste 19 de maio, Dia Nacional da Defensoria Pública, precisamos reafirmar: não há justiça onde há silêncio imposto pela pobreza. Não há democracia onde há defensores e defensoras desvalorizados, mal remunerados, esquecidos nas contas do orçamento.
Fortalecer a Defensoria é fortalecer o Brasil. É dar nome, rosto e dignidade a quem sempre teve apenas número de processo. É dizer, com todas as letras: aqui, o Direito não é privilégio, é direito. E quem o garante merece ser tratado com a mesma grandeza.
